RIO — Um grupo de amigos fiéis, montado em abril do ano passado,
trabalha intensamente na casa de Henrique Pizzolato, uma cobertura na
Rua Domingos Ferreira, em Copacabana, para limpar a imagem do ex-diretor
de Marketing do Banco do Brasil, o único mensaleiro que encontra-se
foragido. O desaparecimento de Pizzolato, que teria ido para a Itália,
aproveitando-se da dupla cidadania para escapar da condenação a 12 anos e
sete meses de prisão em regime fechado, não desativou esse núcleo duro,
que, munido de dois computadores instalados na sala do apartamento,
divulga dados de um dossiê, principalmente na blogosfera, destinado a
contestar o papel atribuído a Pizzolato no esquema de desvio de recursos
públicos para o pagamento de propinas.
O
ex-dirigente do BB teria tomado a decisão de deixar o Brasil no início
de setembro, logo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou
os seus embargos de declaração, encerrando assim as esperanças de
redução da pena. Para chegar a Europa, onde teria entrado pela Espanha,
ele saiu do Rio de madrugada, com um amigo na direção de um carro de
passeio, e viajado cerca de um dia até um ponto no Sul do país onde
cruzou a pé a fronteira com o Paraguai. Antes de sair, teria passado por
Concórdia, cidade onde nasceu no Oeste catarinense, mas o amigo que o
acompanhava o impediu de ver o pai, Pedro Pizzolato, por questão de
segurança.
Processo na Itália
No STF, o
ex-diretor de marketing do BB foi condenado por corrupção passiva,
lavagem de dinheiro e peculato, em decorrência da liberação de R$ 73
milhões do fundo Visanet para a DNA Propaganda, empresa de Marcos
Valério, sem garantias dos serviços contratados. A estratégia de
Pizzolato, se confirmada a fuga para a Itália, país onde tem parentes, é
pedir à Justiça local a abertura de um processo judicial sobre o
mensalão, amparado por uma convenção da ONU, antes que o governo
brasileiro tome a iniciativa. Neste caso, a peça mais valiosa de sua
defesa seria um regulamento da Visanet, arrecadado pelo núcleo de
amigos, para sustentar que o responsável pela gestão do fundo não era
Pizzolato, mas um gestor indicado pelo diretor de Varejo do BB junto ao
Fundo de Incentivo Visanet.
O núcleo duro é composto pela mulher
de Pizzolato, a arquiteta Andréa Eunice Haas, que recentemente desfalcou
o grupo para se encontrar com o marido, o ex-funcionário do BB e
ex-dirigente sindical Alexandre Teixeira, e o blogueiro e jornalista
Miguel do Rosário. O jornalista Raimundo Pereira, da revista “Retrato do
Brasil”, participa eventualmente das reuniões.
— Tudo que
afirmamos está devidamente sustentado por documentos — diz Alexandre,
cuja eloquência rendeu o apelido de “Terremoto”.
Após voto de Lewandowski, ex-diretor parou de ver o julgamento
Pizzolato
guarda mágoa do PT porque, ao longo do processo, esperou um apoio que
não veio. A solidariedade petista chegou só depois da condenação, quando
não restava esperança. Aos amigos, lembrava o que fizera pela sigla. Em
1989, o vice de Lula na campanha para a Presidência era José Paulo
Bisol. Os amigos contam que Bisol não poderia ser candidato porque teria
uma dívida com o BB e isso era um impedimento legal. Pizzolato disse
aos mais próximos que pagou o valor devido com um cheque e que nunca
recebera o dinheiro de volta.
Mágoa maior é a que a mulher de
Pizzolato, Andréa, guarda do revisor da Ação Penal 470, ministro Ricardo
Lewandowski. O rancor supera o descontentamento do casal com o relator,
ministro Joaquim Barbosa. Lewandowski é quem teria dado o golpe fatal
para a condenação de Pizzolato, despertando a ira de Andréa. A decepção
era tanta que, a partir do voto do revisor, o então réu nunca mais
ligara a TV para ver o julgamento. Passou a receber notícias somente via
advogado.
Além de mulher, Andréa era a companheira de hobby de
Pizzolato. Arquitetos formados pela
Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), em São Leopoldo (RS), os dois se preocupavam em dar um
toque pessoal ao apartamento, pintando detalhes de flores nas paredes.
No ápice do escândalo, eles se separaram e se reconciliaram. Foi por
incentivo dela que o núcleo se formou. Embora vivam hoje juntos, o
registro em cartório do imóvel declarado por Pizzolato no processo do
mensalão, um duplex na Rua República do Peru, 72, em Copacabana, informa
que o ex-dirigente do BB e Andréa teriam se separado oficialmente em
2006, um ano após o escândalo. Na partilha de bens, averbada em
cartório, este apartamento de 150 metros quadrados teria ficado para a
mulher.
Católico, Pizzolato chegou a estudar para ser padre. Foi
seminarista junto com o atual ministro da Secretaria-Geral da
Presidência da República, Gilberto Carvalho. Desde o começo do
julgamento, o ex-diretor de marketing do BB começou a frequentar
diariamente a Igreja Nossa Senhora de Copacabana.
Há duas semanas, Pizzolato e a mulher se reencontraram
Em
casa, guarda uma coleção de imagens de São Francisco. No escritório
onde passava os dias navegando na internet, há duas imagens do Sagrado
Coração de Maria, uma do Anjo Gabriel e seis terços pendurados na
parede— o gancho do sétimo terço estava vazio.
Quanto tinha
passaporte, ele visitou Fátima e Lourdes, em Portugal, e Assis, na
Itália. Fez ainda o caminho de Santiago de Compostela. Recentemente,
Pizzolato procurou conforto no Kardecismo. Ele ia a um centro espírita
no Engenho Novo, na Zona Norte do Rio, e ainda tinha tempo para
frequentar sessões de terapia.
A mochila que ele carregou nas
costas, levada discretamente para o carro horas antes da fuga, tinha,
entre outros itens, três pares de meia, três cuecas e uma pequena bolsa
com objetos de higiene pessoal. Antes de seguir a pé pela estrada, para
se encontrar com outro motorista no Paraguai, ele teria pedido ao amigo:
“Cuide da minha baixinha”. Era assim que ele chamava a mulher, com quem
não teve filhos. A saudade durou menos de 40 dias. Há duas semanas, ela
foi ao encontro dele.